Um pouco de história
“O primeiro caráter de heresia anti-litúrgica é o ódio da
Tradição nas fórmulas do culto divino (...). Todo sectário,
querendo introduzir uma nova doutrina, encontra-se
infalivelmente em presença da liturgia, que é Tradição no seu
mais alto poder, e ele não terá repouso senão quando tiver feito
calar esta voz, senão quando tiver rasgado estas páginas que
exalam a fé dos séculos passados (...)” (Dom Guéranger,
“Institutions Liturgiques”).
“O principal instrumento da Tradição da Igreja está
encerrado nas suas orações” (Bossuet, “Instruction sur les états
d’oraison”, tr. I, liv. VI, nº 1).
“Ut legem credenci statuat lex supplicandi” (De gratia Dei
“Indiculus”, Denz.-Sch. 246). No culto se professa a fé.
“Toda a liturgia é um escrínio da Fé católica, enquanto
testemunho público da Fé da Igreja” (Pio XII, “Mediator Dei”,
nº 43).
“O culto que a Igreja rende a Deus é uma contínua profissão
de fé católica” (Santo Agostinho, apud “Mediator Dei”, nº 43).
Daí o paralelismo que existe entre a norma de agir da Igreja
e da heresia. Como a Liturgia serve não somente para o culto
divino mas também para a profissão e difusão da fé católica, assim os hereges se aproveitam da Liturgia para deturpá-la no
sentido de que lhes sirva para a fixação dos seus erros.
São Paulo já advertia contra aqueles que procuravam
deturpar a verdade revelada de acordo com os seus gostos
pessoais (II Tim., IV, 3ss.).
Podemos dizer que cada heresia tem sua expressão litúrgica.
Aduzimos aqui o testemunho autorizado do Pe. Manuel Pinto,
S.J., em seu livro “O valor teológico da Liturgia”, art. II:
“Quando houve abalos na fé, houve em geral subversões na
Liturgia. As extravagâncias doutrinais dos gnósticos no século
II, fizeram-nos cair em extravagâncias litúrgicas. Entre eles,
Valentim servia-se dos hinos litúrgicos para neles vazar as suas
doutrinas, como refere Tertuliano (...). As grandes heresias que
nos séculos IV e V sacudiram a Igreja, buliram também a
Liturgia (...). Os eutiquianos ou monofisitas, para favorecerem
a sua heresia, modificaram na Missa as palavras que
acompanham a mistura das duas espécies depois da fração da
Hóstia. E ainda hoje os Armênios monofisitas não lançam as
gotas de água no vinho do cálice, para não significarem com
isso a distinção das suas naturezas em Cristo (...). Nos séculos
VIII e IX as controvérsias mais importantes que se debatem na
Igreja, todas elas têm relação muito próxima com a Liturgia.
No Oriente a heresia dos iconoclastas, e a definição do II
Concílio de Nicéia que os condenou, são diretamente litúrgicas
no seu objeto: o culto dos santos e das imagens (...). Os hereges
do século XII e XIII, Valdenses e Albigenses, em conseqüência
dos seus princípios gnósticos e maniqueus, segundo os quais a
matéria é origem do mal, impugnavam radicalmente o culto sensível da Igreja. (...) Estalou por fim o protestantismo, a mais
revolucionária das heresias. Subverteram os Protestantes o
Dogma tradicional, e logicamente também o culto estabelecido.
(...) Do rescaldo da heresia protestante acenderam-se ainda na
Igreja o jansenismo e galicanismo, que vieram a eclodir no
conjunto de erros proclamados no Sínodo de Pistóia, em 1786,
alguns acerca de Liturgia. Todos eles foram condenados na
Constituição “Auctorem fidei” de Pio VI. Os erros litúrgicos
são diretamente contrários à disciplina; no fundo porém, são
contrários à doutrina, e foi sobretudo neste sentido que eles
foram condenados”.
É preciso acrescentar, com relação à pseudo-reforma do
século XVI, que a reação da Igreja não se fez esperar. O
Concílio de Trento, entre outros erros protestantes, condenou: a
doutrina de que a Missa é mera comemoração do sacrifício já
realizado na Cruz; a obrigatoriedade da consagração em voz
alta; o uso exclusivo da língua vernácula; a obrigatoriedade
para os fiéis da comunhão sob as duas espécies, etc. Na Sessão
XXII, o referido Concílio, “fixando de um modo definitivo os
‘cânones’ do rito, erigiu uma barreira intransponível contra
qualquer tentativa de atacar a integridade do Mistério” (Carta
dos Cardeais Ottaviani e Bacci).
Ainda quanto ao Protestantismo, L. Fendt diz: “Em nenhum
terreno o pulso da Reforma bateu com tanto calor quanto no
culto. O culto foi o corpo através do qual o espírito de Lutero
penetrou na vida do povo” (“Der lutherische Gottesdienst des
16. Jahrhunderts”, p. V, citado por Luther Reed, The Lutheran
Liturgy, p. 107).
Não é diversa a atitude dos modernistas, como se deduz da
Encíclica “Pascendi” de São Pio X, linha de procedimento
destacada também por Pio XII nas Encíclicas “Humani
Generis” (que condenou a Nouvelle Théologie), “Mystici
Corporis” e “Mediator Dei” que reprovam vários erros
litúrgicos correntes: como o altar em forma de mesa, a
equiparação entre o fiel e o sacerdote, a aversão à missa
individual com assistência só de acólito, a missa
exclusivamente em vernáculos, a exigência da comunhão de
todos os fiéis para efetiva participação, minimizando do caráter sacrifical da Missa, ênfase no aspecto de banquete ou ceia,
negação da presença real, menosprezo por certos atos do culto
eucarístico (por exemplo, a bênção do Santíssimo Sacramento,
Hora Santa, etc.).
E nos nossos dias?
O novo “Ordus Missae”
Estas observações históricas despertam o problema que põe à
consciência católica a consideração do novo “Ordo Missae”,
especialmente depois que os Cardeais da Cúria Romana,
Ottaviani e Bacci, “após examinar e fazer examinar o novo
“Ordo Missae”, concluíram que ele representa, tanto em seu
conjunto como em pontos particulares, um afastamento
impressionante na teologia católica da Santa Missa, tal como
foi formulada na sessão XXII do Concílio Tridentino (...). As
recentes reformas demonstraram, à saciedade, que as novas
transformações na Liturgia só conduzem a uma total
desorientação dos fiéis, que já apresentam sinais de indiferença
e de diminuição da fé” (Carta ao Papa, 5-10-1969).
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